domingo, 4 de novembro de 2012

A Crise e a Revolução Comunista no Brasil

...sem fé em si mesma, sem fé no povo, resmungando contra os de cima, tremendo diante dos de baixo; ... espavorida diante da tempestade mundial; nunca com energia, e sempre com plágio; sem iniciativa; ... um velho maldito, condenado, no seu próprio interesse senil, a dirigir os primeiros impulsos de um povo jovem e robusto...”

(K. Marx, “Nova Gazeta Renana”, 1848, ver Literrariches Nachlass, III, p. 212 - in V.I. Lênine, “Obras Escolhidas”, Tomo I, p. 26, Edições Progresso Moscou).
Por mais de 6 décadas, o MCB vinculou a luta pela Revolução Comunista no Brasil a uma estratégia que limitava, a iniciativa e todo o trabalho revolucionário a uma luta por uma revolução democrática burguesa, estabelecendo um papel revolucionário e progressista à burguesia industrial. Esta estratégia, durante os vários períodos de crises revolucionárias que viveu a sociedade brasileira, mostrou claramente a essência do ser social da classe burguesa no país, enquadrando-se com uma tremenda precisão nas características do ser social da burguesia alemã, definida por Marx, durante a revolução democrática-burguesa, de 1848. Portanto, a estratégia da revolução brasileira teve uma função muito mais desestruturadora e deformadora das forças do comunismo, do que um papel construtivo, organizador e formador das forças revolucionárias; vale dizer, do proletariado.
A crise, que se instaurou no Movimento Comunista Brasileiro, levou ao esfacelamento total do Partido Comunista. Embora tenha se manifestado, com toda a força, durante a década de 60, se acentuado no início da década de 80 e continue na de 90, acompanhando todo o processo de crise que também se desenvolve no Movimento Comunista Internacional. Suas raízes fundamentais estão nas bases teóricas, que sedimentaram as formulações estratégicas, táticas e organizativas do Partido Comunista no Brasil. Os comunistas brasileiros foram incapazes de se apropriarem corretamente da teoria Marxista-Leninista e, em conseqüência, não compreenderam a essência das características fundamentais da formação social brasileira, por conseguinte, aplicaram incorretamente as teses da Internacional Comunista à realidade brasileira, dando origem à estratégia equivocada que orientou e formou todo o movimento comunista e revolucionário no país, de 1928 até o presente momento, de seu mais completo aniquilamento pelas forças da reação e inimigo de classe.
A assimilação mecânica do Marxismo-Leninismo influenciou em todos os sentidos o MCB. Ela se refletiu na tática, na política de organização e de composição social do Partido Comunista. As principais bases de solidez responsáveis pelo seu crescimento e prestígio, durante quase 6 décadas (1922 a 1981), foram por um lado, suas posições internacionais, e por outro, as que resultaram da entrada da maior expressão do movimento revolucionário brasileiro, durante as décadas de 20 e 30 e mais tarde, de todo o movimento comunista do país, Luiz Carlos Prestes. Naturalmente que durante estas 6 décadas, todas as deficiências decorrentes da estratégia se apresentaram no seu interior, mas eram eclipsadas constantemente pela correção de suas posições internacionais e pela força moral e revolucionária do seu Secretário Geral. As inúmeras cisões iniciam antes mesmo de 1928, como se comprova pelo“relatório Canellas”, em 1924, e logo depois com o afastamento de Mário Pedrosa e outros, que passam a constituir a Liga dos Comunistas Internacionalistas e editam o Jornal “Luta de Classes”,juntamente com Edmundo Moniz (a cisão Trotskysta). Mas estas seqüelas não eram capazes de abalar, radicalmente, a estrutura e o prestígio do Partido junto às classes trabalhadoras.1
Com a crise que se instaura no MCI, a partir do XX Congresso do PCUS, em 1958, cai o primeiro pilar de sustentação política do Partido,“as novas orientações políticas”, no plano internacional, do PCUS, são contestadas, constituindo-se um quadro de enorme divisão dos comunistas, que revela abertamente suas deficiências teóricas e o questionamento da sua estratégia. Esta nova realidade conduz Luiz Carlos Prestes a uma profunda reflexão crítica e autocrítica, desencadeia uma intensa luta no interior da cúpula partidária, que perduraria por mais de uma década (1968 a 1979): período em que parte do CC é retirada do país, particularmente, Prestes, Agliberto e outros, “por motivos de segurança”. Quando finda o exílio e retornam ao Brasil, uma nova correlação de forças já se encontra estabelecida, através de uma aliança espúria entre a parte direitista do CC e a parte oportunista das direções intermediárias, alçadas à condição de “dirigentes nacionais”, durante oexílio de parte de seus membros. A “maioria” direitista isola a“minoria” revolucionária dentro do CC, convoca um Congresso de cartas marcadas para legitimar a “nova direção nacional” e suas posições de capitulação e colaboração com a ditadura militar e o governo dos monopólios do general Figueiredo. Prestes lança então sua histórica “Carta aos Comunistas”, onde conclama as bases para tomarem o destino do partido em suas mãos; mas, sem uma resposta imediata, o velho dirigente afasta-se do Partido e é acompanhado por centenas de militantes, dentro e fora do país. Cai, deste modo, o segundo e último pilar de sustentação da estrutura partidária, abre-se um período de grande degenerescência ideológica entre os comunistas, que somada à súbita queda do campo socialista do Leste, a trágica desintegração da URSS e o esfacelamento do PCUS, cria o espaço para a “maioria”oportunista e direitista do CC, de contrabando, levar à desintegração total do PCB, golpeando todo o movimento revolucionário e operário no país.2
Portanto, a crise que se instaurou no MCB não é uma crise do comunismo, mas uma crise dos comunistas. Decorre, por um lado, da ausência de uma formulação estratégica efetivamente revolucionária, que aponte clara e objetivamente o caminho da Revolução Comunista no Brasil; e por outro, da inexistência de uma experiência organizativa e de luta revolucionária concreta, que atue como força moral capaz de conquistar o respeito e o reconhecimento da classe operária e demais trabalhadores no país. As organizações revolucionárias que se formaram, a partir da década de 60 —período de luta armada contra a ditadura militar, instaurada com o golpe de 1964— e que desenvolveram a crítica teórica e aprofundaram os seus estudos sobre a teoria Marxista-Leninista e a realidade brasileira, não constituíram uma forma organizativa capaz de se impor, como experiência revolucionária concreta sobre as demais organizações e, particularmente, junto à classe operária; as que se bateram em armas contra a ditadura militar, foram desbaratadas e barbaramente aniquiladas, revelando sua insuficiência teórica e inocência revolucionária; por último, as tendências comunistas que permaneceram no Partido, até sua desintegração total, tornaram-se prisioneiras desta herança de deficiências do MCB.
Desta forma, tornou-se uma tarefa imediata para os comunistas revolucionários no Brasil, a resolução da crise do MCB, cujo cerne reside em dois candentes problemas do processo revolucionário brasileiro: a) o problema teórico, que deve ser respondido com uma formulação estratégica para a revolução comunista no país; e b) o problema moral, que deve ser respondido com uma experiência organizativa e de luta revolucionária concreta, mesmo dentro do atual quadro totalmente desfavorável para a classe operária e os comunistas revolucionários no país. A contradição aparente entre teoria e prática revolucionária, aqui se resolve pela aplicação do materialismo dialético, da mesma forma que F. Engels3, no seu livro “O Anti-Düring”, solucionou a contradição entre estar aqui e naquele lugar ao mesmo tempo: pelo movimento, pela história, pela prática, e pela ação. Não se pode negligenciar em uma batalha, entre forças desproporcionais, a importância da iniciativa de combate para os que estão em menor número, quem não ousa e não se movimenta é um dócil alvo: a morte é certa.
O MCB, ao longo de sua trajetória, acumulou experiências importantes e ainda hoje tem desenvolvido novas formas de existência. Com a pulverização do PC, dezenas de organizações, micro-organizações e círculos marxistas se proliferam por todo o país. Muitos destes agrupamentos têm efetuado uma espécie de crítica da crítica, disseminando o germe revolucionário que poderá se constituir nas bases de Refundação do Partido Comunista, a única forma de organização historicamente superior da classe revolucionária, o proletariado. Deste processo, que hoje aparentemente se desenvolve como “erva daninha”, é que, por contradição, se reorganizará o MCB. Os esforços neste sentido já têm conquistado muitos destes agrupamentos e círculos, para uma experiência prática e organizativa comum e, na medida em que estas experiências concretas de luta contra o capital e a classe burguesa no país vão se desenvolvendo, suas vitórias e fracassos as impulsionam para um processo comum de luta de resistência, organização e elaboração teórica, isto é, para a unidade. Assim, estão se formando as bases subjetivas da Refundação do Partido Comunista no Brasil.
O nosso agrupamento, que postula a Refundação do Partido Comunista, resulta deste novo processo vivido pelo Movimento Comunista Brasileiro e, ao longo de seus 17 anos de existência, demonstrou que ainda continua a carregar muito desta herança teórica, organizativa e prática desenvolvida pelo ex-Partido Comunista. É como diz Marx4,“Os mortos agarram-se e oprimem o cérebro dos vivos”. Mas para efetuar de fato esta ruptura, é necessário entender esta herança no seu cerne, através de um longo processo de crítica e autocrítica coletiva, e com isto contribuir, teórica e praticamente, para a Refundação do Partido Comunista.
1. O problema teórico
da estratégia
A estratégia para a Revolução Comunista no Brasil, não pode decorrer da aplicação mecânica do Marxismo-Leninismo à realidade brasileira. É necessário romper com as teses do VI Congresso da Internacional Comunista, a base fundamental da orientação política do antigo PCB, que diversos agrupamentos têm adaptado para o momento atual, através da concepção estratégica que vê nas etapas da revolução comunista no país, uma primeira de caráter popular e democrática (Articulação), ou nacional e democrática (MR-8); ou ainda socialista de mercado (PC do B), etc. Estas teses, embora se apresentem como formulações inéditas e respaldadas na análise de Lênin sobre o imperialismo, logo travestidas de uma revolução antiimperialista, na verdade, escamoteiam sua base teórica de existência: as teses do VI Congresso da Internacional sobre os países coloniais e semicoloniais. Todas caem naquela máxima levantada por Prestes: “muito boas para estes países, mas inaplicáveis para o Brasil”. Mas estas teses, como já vimos, orientaram todo o processo de luta, organização e prática revolucionária do PCB e do movimento revolucionário no país, por mais de 6 décadas. Sua aplicação à realidade brasileira, naturalmente, resultará sempre na tentativa de superar as deficiências da estratégia pela tática, dando origem a uma tática esquerdista e outra direitista; os que consideram o problema de seus fracassos nas deficiências organizativas e nas alianças, e os que crêem que este problema deriva do sectarismo e da incapacidade de conquistar a burguesia “nacionalista” para as posições revolucionárias.
A outra fomulação estratégica que se apresentou no MCB, em alternativa às concepções do Partido, é aquela que se fundamenta em uma concepção subjetivista da realidade nacional, desenvolvida por Caio Prado Jr.5, em “A Revolução Brasileira”. Ela se sustenta na idéia de que o Brasil já nasceu capitalista, face às suas relações com o capitalismo mercantil, daí decorre a aplicação mecânica das categorias do marxismo sobre a formação social brasileira, enquadrando escravos, servos, camponeses e senhores de terra, nas categorias de classes proletária, burguesa e pequeno-burguesa, quando na verdade o modo de produção capitalista no Brasil somente se estabelece, objetivamente, e ainda em sua forma não clássica, com a passagem do trabalho escravo ao assalariado e, subjetivamente, com a proclamação da República e, mais tarde, com a revolução de 30. A maioria dos agrupamentos que se agarram a esta formulação estratégica, nas décadas de 60 e 70, parodiam em larga escala a luta teórica dos jovens filósofos revolucionários da Alemanha, do século XIX6, e apesar do profundo heroísmo com que se bateram contra a “lei da gravidade”, a partir destas idéias, desempenhamos papéis de“cordeiros que se faziam passar por lobos”.
Vemos, pois, que hoje todas estas idéias foram desmentidas pela prática. A análise aqui desenvolvida, acerca da realidade brasileira, demonstra, exaustivamente, que o desenvolvimento capitalista no Brasil somente assume sua forma clássica a partir dos anos 30. É somente a partir daí que o processo de produção e reprodução do capital desenvolve os elementos clássicos do capitalismo. Mas até mesmo estas condições de desenvolvimento derivam e reproduzem sempre as características fundamentais da sociedade, impedindo que a contradição fundamental da sociedade, entre o capital e o trabalho, se manifeste na sua forma clássica, mas através das contradições entre a burguesia monopolista (da terra e do capital), que representa o cerne do capitalismo e do imperialismo no país, versus o povo explorado (o proletariado, o proletário-camponês, as camadas médias urbanas, a pequena-burguesia e os setores da burguesia nacionalista). Esta contradição se expressa no campo através da contradição entre a burguesia latifundiária versus o proletariado agrícola, conjuntamente com o proletário-camponês (os Sem Terra)7e o campesinato pequeno-burguês; na cidade, ela se manifesta através da contradição entre a burguesia monopolista versus o proletariado, conjuntamente com o proletariado-pequeno-burguês e as camadas médias urbanas.
Decorre deste fenômemo uma interpretação equivocada que extrai a conclusão de uma contradição antagônica entre as características fundamentais do desenvolvimento capitalista no Brasil —a dependência ao imperialismo, o domínio dos monopólios nacionais e estrangeiros e do latifúndio— e um desenvolvimento capitalista autônomo concorrencial, tendo por base a propriedade individual, em constante florescimento e ruína. Esta concepção, com a nova grande ofensiva da contra-revolução burguesa mundial, o neoliberalismo, vem ganhando espaço outra vez entre os círculos revolucionários do país. Mas no Brasil, a lógica do desenvolvimento capitalista reside justamente neste fenômemo, que dado o processo histórico da formação social brasileira, o processo de colonização, acentuou-se em demasia, distanciando-se do processo clássico do capitalismo na Europa. Portanto não se pode concluir por uma etapa de transição, entre capitalismo e socialismo, cujo objetivo seja o desenvolvimento deste capitalismo concorrencial, através de uma revolução “democrática-burguesa”, mesmo que ela seja maquiada de “socialismo de mercado”, como fazem as teses defendidas pelo PC do B8, trata-se de socialismo de palavra e capitalismo de fato. Não se pode falar com seriedade ao se defender uma etapa da revolução brasileira, cujo objetivo seja romper com o imperialismo e desenvolver uma espécie de capitalismo independente. Ora, o imperialismo não é um elemento externo, que exerce o domínio político e econômico superposto a um suposto capitalismo nacional. No Brasil, o imperialismo constitui parte dinâmica do modelo associado de acumulação monopolista de capital da sociedade, tornando-o estruturalmente dependente do imperialismo. Portanto é impossível uma revolução antiimperialista, sem que ela seja antimonopolista e antilatifundiária, e esta última, sem que ela seja anticapitalista, logo pelo socialismo.
A) A contradição fundamental — O recente desenvolvimento capitalista no mundo tenta elevar a um novo plano histórico, tanto do ponto de vista internacional, como e sobretudo, do ponto de vista nacional, a acumulação e reprodução do capital monopolista. A grande ofensiva neoliberal da contra-revolução burguesa não impede o desenvolvimento capitalista da sociedade, da mesma forma que o keynesianismo não impediu —o Brasil é o país mais industrializado do Terceiro Mundo— dá-lhe apenas formas determinadas; é pois, sobre a iniciativa do imperialismo que se dá o processo de industrialização e a constituição do modelo associado de acumulação monopolista de capital no Brasil. Nestas condições objetivas, o proletário-camponês, para lutar contra o oligarca da terra, é obrigado a lutar também contra a burguesia industrial e comercial. No campo, o oligarca da terra representa a fusão do imperialismo com o latifúndio, os modernos complexos agroindustriais, químicos e madeireiros, constituídos pela associação do capital monopolista nacional e estrangeiro.
A viragem de 180 graus na política econômica do imperialismo, do keynesianismo para neoliberalismo, levou a burguesia monopolista no país a reordenar o modelo associado de acumulação monopolista de capital, segundo as necessidades da globalização imperialista. O processo de privatização tem mudado o papel do Estado na economia, de produtor direto para o de gerente, alterando a infra-estrutura econômica e acentuando as características fundamentais da sociedade. A economia política do capital tem acirrado todas as contradições sociais e revelado, abertamente, todo o conteúdo antioperário, anti-social e antinacional do modelo econômico do sistema capitalista e da política neoliberal. Revela ainda que o domínio das oligarquias, nacional e estrangeira, sobre todos os aspectos da vida social, submete, impiedosamente, a esmagadora maioria do povo a uma situação de terrível miséria, absoluta opressão e total falta de direitos. Em conseqüência disto tudo, os interesses da classe operária e dos trabalhadores em geral se contrapõem radicalmente ao domínio da oligarquia monopolista e latifundiária e o seu modelo econômico, que representam no país o cerne do regime capitalista e do imperialismo. E diante desta realidade objetiva, os traços fundamentais da sociedade brasileira, a dependência ao imperialismo e o domínio dos monopólios nacionais e estrangeiros e do latifúndio, expressam a contradição entre o povo versus oligarquia financeira —a burguesia monopolista da terra e do capital— revelando claramente a contradição fundamental da sociedade brasileira: a contradição entre o proletariado e a burguesia.
B) O caráter da Revolução — A contradição fundamental da sociedade brasileira é aquela que opõe o capital ao trabalho. Portanto, o caráter da Revolução é Socialista. O desenvolvimento capitalista no Brasil condensou, num modelo associado de acumulação monopolista de capital, as características fundamentais da sociedade e este fenômeno desfigurou a manifestação da contradição fundamental do sistema. Ao contrário da Europa, o processo de monopolização da economia nacional não se desenvolveu da contradição, entre o capital e o trabalho, em um estágio de“livre iniciativa ou concorrencial” do sistema. Aqui, este fenômeno —a monopolização da economia— é herdado das características fundamentais da formação colonial brasileira, historicamente determinada pela particularidade do modo de exploração. As contradições que derivam desta realidade objetiva, as que contrapõem o povo ao imperialismo e o campesinato ao latifúndio, não são formas intermediárias de manifestação da contradição fundamental do sistema. Elas não caracterizam a necessidade objetiva de uma etapa capitalista, que as supere para que a contradição entre o capital e o trabalho se manifeste, abertamente, em sua forma clássica. Pelo contrário, elas caracterizam as formas mais desenvolvidas e superiores de manifestação da contradição fundamental do sistema capitalista, o estágio monopolista e de exportação de capitais: a necessidade imperialista. E deste modo, somente atribuem um conteúdo mais objetivo ao programa e às tarefas históricas da Revolução Socialista no Brasil: a supressão dos monopólios, latifúndios capitalistas e da dependência ao imperialismo, pela abolição da propriedade privada dos meios de produção e a sua socialização. Logo, seu conteúdo anticapitalista sintetizado no seu caráter socialista, expressa também o conteúdo antiimperialista, antimonopolista e antilatifundiário e transformará, estas características fundamentais da sociedade, de base objetiva do desenvolvimento capitalista, em base objetiva e ponto de partida para o desenvolvimento socialista e a edificação do comunismo no Brasil.
Mas, se por um lado, as condições objetivas para revolução já estão dadas, por outro, em relação às condições subjetivas, o mesmo não se pode afirmar. As transformações na ordem jurídica, política e cultural da sociedade, formas ideológicas pelas quais os homens tomam consciência dos conflitos materiais, expressas claramente na anatomia da sociedade civil, na forma de Estado e organizações sociais, demonstram a inexistência da organização subjetiva do proletariado no país: o Partido Comunista . Este fator impede que as condições subjetivas para a revolução socialista no Brasil se desenvolvam numa relação diretamente proporcional ao das condições objetivas. Trata-se aqui de aplicar a mesma lógica dialética que levou Lênin a definir a primeira etapa da revolução russa em 1905, resguardando-se as situações e realidades históricas distintas, e sobretudo, as conclusões:
A vontade pode ser única num sentido e não ser única noutro. A ausência de unidade nas questões do socialismo e na luta pelo socialismo, não exclui a unidade de vontade nas questões da democracia e na luta pela república. Esquecer isto, significaria esquecer a diferença lógica e histórica entre o caráter da revolução democrática e a socialista. Esquecer isto significaria esquecer o caráter da revolução democrática como sendo de todo o povo: se é de todo o povo significa que há‘unidade de vontade’, exatamente na medida em que esta revolução satisfaz as necessidades e exigências de todo o povo. Para além dos limites da democracia, nem sequer se põe a questão da unidade de vontade entre o proletariado e a burguesia camponesa. A luta de classe entre eles é inevitável, mas, no terreno da república democrática esta luta será a luta popular mais profunda e mais vasta pelo socialismo”.
(V. I. Lênin, “Duas Táticas da Social-Democracia” na Revolução Democrática, “Obras Escolhidas”, Volume I, p. 432, Edições Progresso - Moscou- 1977)
A ascendente unidade de vontade popular no país, contra o neoliberalismo do governo das oligarquias, que acentua o domínio dos monopólios, do latifúndio e a dependência ao imperialismo, não se manifesta igualmente pelo socialismo. Muitos setores, que hoje se confrontam com a burguesia monopolista, ainda teimam em desvincular a luta contra a política neoliberal da luta contra o imperialismo e, esta última, da luta contra o capitalismo e pelo socialismo. Esta condição subjetiva se manifesta nas camadas médias: militares, intelectuais e movimentos da pequena burguesia urbana e rural; e, até mesmo, em agrupamentos políticos organizados, que até ontem professavam seu credo no socialismo. Os setores do proletariado, presentes no Movimento Sindical, e que despertaram para o processo político durante a luta contra a ditadura militar, com a crise do MCB, se dividiram: sua maior parte se posicionou contra o socialismo marxista e pelo capitalismo civilizado (uma espécie de social-chauvinismo); a outra menor, mesmo reafirmando sua convicção pelo socialismo como única solução para os problemas do povo brasileiro, mantém propostas marcadas ainda pela visão de um socialismo pequeno-burguês, que ora é reformista, ora é radicalismo artificial.
Do conjunto de indivíduos que compõem as classes sociais da sociedade brasileira atual, menos de 15%9é filiada ou participa de alguma organização social, cultural, de classe ou política. Quase nove décimos da população operária e proletarizada está fora do alcance das organizações políticas e do controle das instituições governamentais; localizando-se nas periferias dos grandes centros urbanos, em cortiços, favelas e bairros miseráveis. Sua atual submissão ao estado burguês se dá, particularmente, pelas aparelhos ideológicos (emissoras de TV’s, rádios, seitas religiosas, a Igreja e as manifestações culturais -esporte, carnaval, bailes funks etc...) e pelo terror dos aparelhos repressivos institucionais e clandestinos ( FFAA, aparato policial civil e militar, agências de informações e fundamentalmente os esquadrões da morte, polícia mineira, etc.). Mas o verdadeiro grau de controle do Estado burguês sobre esta parcela das classes trabalhadoras não é possível mensurar. Pois, ao se julgar pelas tragédias do seu cotidiano de opressão e exploração, as intempestivas rebeliões (o fechamentos de vias e logradouros públicos, ocupações urbanas e rurais, saques, arrastões, linchamentos, depredações etc...) e o crescente percentual de abstenção, votos nulos e brancos, nas eleições, tal controle parece extremamente incapaz de conter seu potencial altamente explosivo. Este setor do proletariado não tem uma posição definida contra ou a favor do socialismo e oscila, de uma posição para a outra rapidamente como troca de religião, time de futebol e de partido. Suas lutas são intempestivas e imediatas pela sobrevida miserável, indicando também uma crescente unidade de vontade contra o capital: a luta contra o desemprego e a fome e pela moradia, em síntese, a luta pelo seu direito à vida.
Na medida em que, a “Lei Geral da Acumulação Capitalista” se manifesta através das crises cíclicas do capital, cada vez mais insanáveis e devastadoras, as condições objetivas da revolução empurram toda a sociedade para uma nova conjuntura de crise revolucionária; a luta de classes se aprofunda e arrasta esta massa assalariada e camponesa para mais uma lição da história. Diante das profundas e intensas comoções políticas e sociais, as massas aprenderão, com base em suas próprias experiências práticas, que a única solução para a sua mais terrível miséria, cruel exploração e absoluta opressão, no capitalismo, é o socialismo. E somente nestas condições subjetivas a classe operária, através de sua organização revolucionária, o Partido Comunista, poderá então conquistar o apoio decisivo da maioria dos trabalhadores para as posições do socialismo proletário (marxista) e levar a cabo a Revolução Socialista.
Na esfera internacional, mesmo tendo sido debilitada a base de apoio para uma revolução socialista no Brasil, com o trágico desaparecimento do campo socialista do Leste Europeu e da URSS, as condições atuais são em escala infinitamente superiores as que preexistiam durante a Revolução Russa de 1917. A unipolaridade mundial e o hegemonismo norte-americano não passam de “um gigante de pés de barro”10; a existência de China, Vietnã, Coréia do Norte e especialmente Cuba Socialista na América Latina denunciam esta condição no quadro da correlação de forças internacional. O papel destacado de Cuba na luta de resistência ao imperialismo norte-americano e sua grande ofensiva neoliberal impulsiona as condições subjetivas para uma revolução continental, como demonstram a situação mexicana e a guerrilha em Chiapas do EZLN (Exército Zapatista de Libertação Nacional), a situação de Peru, e a guerrilha do Sendero Luminoso e Túpac Amaru, a situação da Venezuela, da Argentina, da Colômbia onde as FARC avançam a cada dia e da América Central.
C) As forças motrizes da Revolução — Os comunistas revolucionários devem concentrar o seu trabalho, prioritariamente, nas forças impulsionadoras da revolução: em primeiro lugar, junto à classe operária, que é a força principal e dirigente da revolução; em segundo lugar, junto ao proletário-camponês, incluindo o semiproletariado rural; em terceiro lugar, junto às grandes massas de subempregados (priorizando o seu setor flutuante e latente nos grandes centros urbanos) e, por último, a pequena-burguesia tradicional e camadas médias urbanas. Muitos setores da burguesia não monopolista (médios e pequenos capitalistas) poderão apoiar a revolução socialista, no primeiro momento, devido a seu conteúdo antimonopolista e antilatifundiário, que deve ser ressaltado inicialmente. Mas quando compreenderem e sentirem que se trata do próprio conteúdo anticapitalista, isto é, que os primeiros são formas específicas de expressão do segundo e que não é possível dissociá-los, este apoio e entusiasmo cessarão e antes mesmo que a revolução seja vitoriosa e se instaure a Ditadura Democrática do Proletariado, o seu ser social falará mais alto e passarão para a contra-revolução, aliando-se à burguesia monopolista e ao imperialismo.
No estágio atual do capitalismo no Brasil, em termos objetivos, os operários, os semi-proletários e demais trabalhadores assalariados e proletarizados (o proletário-camponês inclusive) constituem nove décimos, aproximadamente, da população em idade ativa no país. E na medida em que comece a lutar unitariamente, mesmo por questões aparentemente econômicas, como o salário mínimo real, a estabilidade no emprego para todos os trabalhadores, a redução da jornada de trabalho, possibilitando aumentar o número de trabalhadores empregados ligados direta e indiretamente à produção, ao comércio, às finanças e agricultura, a contradição fundamental entre o capital e o trabalho ficará exposta abertamente. Se esta luta se encaminha para uma Greve Geral11, a classe dominante se dividirá e cairá de joelhos, na medida em que os trabalhadores resistam. Mesmo que ela inicie nas regiões Sul e Sudeste, atingirá no mínimo cerca de 80% da população trabalhadora do país, podendo se transformar numa greve de massas, criando formas inéditas de organização de baixo para cima e embriões de um possível poder proletário, instrumento imprescindível à realização de sua ditadura de classe, juntamente com os seus aliados estratégicos. É claro que a Revolução Socialista só se tornará possível caso a classe operária tenha a hegemonia sobre as massas trabalhadoras e tenha a iniciativa do combate. É claro, também, que o seu plano de combate não se reduz a esta forma de luta, mas o que interessa aqui ressaltar é a importância da iniciativa do combate e que as forças revolucionárias conscientes do seu objetivo e organizadas, segundo um plano tático, poderão derrotar, implacavelmente, seu inimigo de classe. Se a classe operária não estiver firmemente colocada na direção da revolução, certamente será abortada em conseqüência das vacilações das camadas médias e da pequena-burguesia, que buscará arrastar o proletário-camponês para a contra-revolução ou o reformismo.
D) As tarefas principais da Revolução — As tarefas históricas da revolução socialista proletária somente serão realizadas se as forças revolucionárias, dirigidas pela classe operária, demolirem o Estado monopolista burguês. Este Estado é um complexo aparelho burocrático-militar e policial, profundamente reacionário e corrupto. É toda uma poderosa estrutura moldada, minuciosamente, para servir aos interesses dos monopólios, do imperialismo e do latifúndio. Não é necessário que a revolução tenha caráter socialista para destruí-lo. No século passado, Marx12colocava essa questão. Em uma carta a Kulgemann, de 12.4.1871, ele escrevia que a demolição do aparelho burocrático-militar “é condição prévia para uma verdadeira revolução popular...”
* A demolição do Estado monopolista burguês e a edificação do Estado Revolucionário da Ditadura Democrática do Proletariado.
- Com a demolição do Estado monopolista burguês, os trabalhadores assumirão o seu auto-governo, através do Estado Operário, emergente com a revolução socialista. Será um Estado Operário Revolucionário, construído em armas e de baixo para cima, a partir das lutas de classe do proletariado e seus aliados pela revolução. O seu caráter será socialista, pois, através dele, o proletariado exercerá a sua Ditadura democrática de classe, o programa de transição do capitalismo ao comunismo. Participarão do Estado a classe operária, que será a força hegemônica, e seus aliados fundamentais: o proletário-camponês, as camadas médias assalariadas e a pequena burguesia tradicional.
- Determinados setores da burguesia não monopolista, que estejam do lado da revolução, poderão participar do novo Estado socialista, cuja tarefa principal é dirigir a transição das estruturas econômicas e sociais do capitalismo para o comunismo. A revolução não poderá contemporizar ou vacilar na utilização do poder econômico, ideológico, político e militar, para realizar o programa socialista. O forte apoio popular, que auxiliará a classe operária a derrotar o poder da burguesia monopolista e latifundiária (que representam conjuntamente o eixo principal do capitalismo brasileiro) e a demolir o Aparelho de Estado monopolista burguês, não significa um desvio no caráter da revolução. Trata-se apenas das particularidades do processo revolucionário no Brasil, que indica fortemente que o ato de tomada do poder político pelo proletariado se revestirá de características insurrecionais. Além disto, a classe operária exercerá com toda força a sua ditadura de classe para fazer valer seus objetivos estratégicos e impor a disciplina necessária à ação objetiva das forças revolucionárias.
* A Revolução comunista abolirá a propriedade privada capitalista e socializará os meios de produção.
- O primeiro ato da revolução proletária, após a tomada do poder político e militar em suas mãos, será a supressão da propriedade privada sobre os monopólios estrangeiros e nacionais (industriais, comerciais financeiros) e latifúndios, passando-os à condição de propriedade coletiva sob controle do Estado Operário. Redirecionará a produção agrícola para o consumo interno, unificando sua exploração com a da indústria, empregará sua renda nas despesas públicas e eliminará, gradualmente, as desigualdades entre a cidade e o campo. As médias e pequenas unidades produtivas serão agrupadas em sistemas de cooperativas sob o controle do Estado Operário, que planificará, integrará e gerenciará as suas produções, através das formas de auto-governo dos trabalhadores.
* A Revolução Comunista centralizará todo o crédito em suas mãos, fundindo todas as instituições bancárias em um único Banco nacional de capital do Estado e monopólio exclusivo.
* Abolirá todo e qualquer direito à herança e estabelecerá pesados impostos progressivos sobre todas as grandes fortunas, que estejam no país ou no exterior, e sobre as atividades econômicas capitalistas subterrâneas.
* Centralizará, planificará e controlará a produção, os transportes e a distribuição, segundo o plano emergencial de economia de guerra, redirecionando a produção social para atender às necessidades imediatas do consumo interno e o necessário intercâmbio comercial externo.
E) O Estado Operário, constituído ou em constituição pela Revolução Socialista proletária, desenvolverá um Plano Emergencial de economia de guerra que, em linhas gerais, garantirá de imediato:
- O Fim do Desemprego e a abolição do trabalho das crianças(todos segundo a sua capacidade, o seu trabalho)
Incorporação imediata dos trabalhadores no processo de produção, eliminando o desemprego através da abolição do trabalho das crianças, da redução da jornada de trabalho, da organização de exércitos industriais, especialmente para a agricultura, incorporando os trabalhadores Sem Terra e os bóias-frias, tornando o trabalho obrigatório, sob o estatuto da estabilidade no emprego e de um salário real. Além disto, o progresso salarial se efetuará pelo regime de “todos segundo seu trabalho e capacidade”.
- Moradia para toda a população urbana e rural
Habitações para toda a população (urbana e rural), através da repartição disciplinada das propriedades habitacionais, expropriadas pelo Estado Operário, e um plano de construção e desenvolvimento urbano e rural para todo o país. Este processo deve considerar a proximidade do local de trabalho da população.
- O Fim da Miséria e da Fome
Alimentação básica para toda população, segundo o estabelecimento de uma cesta básica alimentar, que passará a ser distribuída pelos postos oficiais de abastecimento do Estado Operário, tanto nas cidades como no campo. O Estado coibirá o mercado negro, o tráfico e todas as formas de sobrevida da economia capitalista. Os grandes supermercados, shoppings e feiras livres serão locais controlados e dirigidos pelo Estado; a atividade econômica para os visitantes, curiosos e contumazes consumidores turistas se efetuará numa rede especial, para que deixem aqui suas divisas e sejam revertidas em benefício dos trabalhadores.
- Saúde pública e gratuita para toda população e velhice segura
A saúde pública e gratuita e a previdência social serão garantidas para todo o povo e chegarão a todos os locais e regiões mais logínquas do país; não haverá população sem médico, enfermeiras, auxiliares, etc. Centros policlínicos e estrutura de emergência serão construídos, seja nas áreas mais populosas, seja nos centros menos densos. Todos os medicamentos serão gratuitos e produzidos por nossos especialistas, cientistas e homens e mulheres do povo.
- Educação pública gratuita e integral, para todas as crianças, escolarização de todos os analfabetos e Revolução cultural
A Educação será pública, gratuita e obrigatória para todas as crianças — nova pedagogia centrada na onilateralidade e em relação dialética com o modo de produção material. Exigirá horário integral e uma rede de estabelecimentos de ensino capaz de promover um ambiente de socialização de fato de crianças e adultos nos valores mais nobres desenvolvidos pela humanidade, os valores do trabalho, da ciência, do comunismo científico e do homem novo. Para as populações adultas serão formadas as brigadas que travarão uma decisiva batalha contra a ignorância, o obscurantismo e todas as formas de opressão do jugo capitalista sobre quase 40 milhões de brasileiros, criando-se as condições da revolução cultural, onde a arte, a literatura nacional e universal serão acessíveis ao povo e impulsionadas ao reflorescimento.
- O Internacionalismo Proletário e a Solidariedade internacional
O Estado Operário estabelecerá os vínculos mais sinceros com os Países Socialistas, Nacionais libertados e o proletariado revolucionário e povos oprimidos que lutam contra o imperialismo e o capitalismo em todo o mundo, particularmente na América Latina. Estes vínculos se estabelecerão em torno da cooperação mútua econômica, cultural e política, visando à reorganização de um sistema internacional e continental, com bases sólidas no Internacionalismo proletário: a solidariedade e o respeito à soberania, autodeterminação e defesa da paz entre os povos e do socialismo.
F) A aplicação do Programa de Emergência — A execução do Plano de Emergência se efetuará sob um cenário de intensa luta de classes, na sua forma mais extrema e violenta: a guerra civil. No plano interno, a contra-revolução burguesa buscará se apoiar nos setores da burguesia não monopolista, da pequena burguesia, das camadas médias, para dividir as forças revolucionárias principais (o proletariado, o proletário-camponês e semi-proletariado) e impedir de todos os meios que a Revolução Socialista se consolide e execute o seu programa. A burguesia monopolista e latifundiária, a partir do exterior, financiará a contra-revolução interna, criando um exército de mercenários, ex-torturadores, e toda sorte de traidores, vende-pátria, elementos contra-revolucionários e ex-colaboradores do antigo regime, para criar uma situação favorável à intervenção direta do imperialismo no país. Externamente, o imperialismo efetuará um bloqueio total econômico, político e militar para sufocar a Revolução Socialista, podendo evoluir para um cerco e invasão, em apoio à contra-revolução.*
O Plano Emergencial deve ser executado mesmo sob estas circunstâncias. Ele é um instrumento econômico, político e militar, que isolará a burguesia monopolista e não monopolista, ganhará o apoio das massas e evitará que se formalize as forças da contra-revolução, sufocando a guerra civil nos grandes centros urbanos e criando as condições para transformar a guerra contra o imperialismo, numa guerra de todo o povo em defesa da Revolução Socialista. Nessas condições, o processo revolucionário consolidará rapidamente o novo Estado Operário Revolucionário e seu programa socialista. Mas isto não significa que a contra-revolução, interna e externa, seja esmagada rapidamente. Com a realização do Plano de Emergência, apenas se criam as condições para se desbaratá-la como força regular capaz de agrupar tropas e combater em campo aberto. A ação contra-revolucionária continuará nos centros urbanos, na forma clandestina e, principalmente, nas regiões do campo e fronteiras, com outros países manobrados pelo imperialismo.
É preciso salientar aqui que, embora as forças motrizes da revolução comunista no Brasil tenham um caráter puramente proletário e proletarizado, ela não está tão próxima da sua fase superior, aquela que Marx afirma que se deverá passar da situação de “cada um segundo sua capacidade para cada um segundo as suas necessidades”. A Revolução, na verdade, se desenvolverá ainda carregando parte da herança do regime anterior, portanto deverá cumprir ainda tarefas democráticas, através ditadura do proletariado (democracia proletária), sejam no plano econômico, sejam no plano político, que unidas as tarefas puramente de caráter socialista, no plano interno e externo, criarão as condições objetivas e subjetivas para passagem a sua fase superior, propriamente comunista: “No lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e antagonismo de classes, surge uma associação em que o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos”.13
G) A conquista da hegemonia pela Classe Operária —Nas condições brasileiras, o meio fundamental para que a classe operária conquiste sua hegemonia é lutando desde agora pelo socialismo. A luta pelo socialismo, quando se efetua dentro de uma democracia burguesa, é, na verdade, a luta direta pelas condições subjetivas para a Revolução. Isto quer dizer que a luta de classes, no plano econômico, político e ideológico, deve se destinar tanto a organização subjetiva do proletariado (o seu partido de vanguarda), quanto à organização, elevação do grau de consciência e intensificação da luta das massas trabalhadoras pelo socialismo. Embora a democracia burguesa atual seja bastante restrita, pois trata-se de uma democracia sob o domínio dos monopólios e do latifúndio a serviço do imperialismo, ela se institucionalizou através de um congresso constituinte e se legitimou através de governos eleitos pelo voto direto. E na medida em que se institucionalizou e se legitimou, dividiu as forças democráticas e populares, criou as condições para executar a política neoliberal —reforma do modelo econômico, que retira o papel estratégico do Estado na economia— e esvaziou o caráter de ruptura da luta por uma democracia popular, transformando-a numa luta pela ampliação da democracia burguesa atual. Contudo, um governo democrático e popular tornará a luta de classes mais aberta e aguda. Isto porque ele tentará uma política de conciliação com o neoliberalismo, destruindo as ilusões dos trabalhadores com a democracia burguesa, e na medida em que não conseguirá resolver a crise do capital, nem o elevado grau de pauperismo das massas, criará as condições favoráveis para que a classe operária se una em torno de um programa socialista, e atraia o conjunto dos trabalhadores para suas posições políticas revolucionárias, coisa que é essencial para se fazer a Revolução.
Deste modo, a luta pela revolução socialista se desenrolará em três fases: a primeira, de preparação das forças de todas as condições subjetivas para revolução socialista, onde se deverá ressaltar taticamente seu conteúdo antiimperialista, antimonopolista e antilatifundiário na luta contra o neoliberalismo; a segunda, de tomada do poder pelo proletariado e seus aliados, onde predominará o conteúdo socialista da revolução e a terceira, de consolidação da Revolução, onde se realiza todo o programa de transição socialista. Ela inicia na luta pelo derrubamento dos governos democráticos burgueses neoliberais (o regime dos monopólios nacionais e estrangeiros e do latifúndio) e após a derrota definitiva destes, na luta pela instauração de um Governo Operário Revolucionário que nacionalize os monopólios e o latifúndio e execute o Plano de Emergência socialista. Com a vitória da revolução proletária e a demolição do Estado monopolista burguês, o Governo Operário Revolucionário aprofundará ao nível econômico, social e estatal, o seu caráter socialista e de ditadura de classe do proletariado, através de sua constituição como Estado Operário e auto-governo dos trabalhadores. A função do Estado Operário e da ditadura de classe do proletariado é executar o Programa Socialista da revolução, de transição do capitalismo para o comunismo. Neste período inicial da Revolução Socialista no Brasil, entendemos o conteúdo político da luta antiimperialis-ta, antimonopolista e antilatifundiária, como um vasto movimento operário e popular pelo socialismo, movimento este encabeçado pelo Proletariado.
2. O problema organizativo
prático do Partido
Como já buscamos demonstrar inúmeras vezes neste trabalho, o desenvolvimento capitalista no Brasil condensou em um modelo associado de acumulação monopolista de capital as características fundamentais da formação social brasileira. Este fenômeno acentuou ainda mais a manifestação da “Lei Geral da Acumulação de Capital”, de Marx14, e concentrou a riqueza e o poder numa ínfima minoria da população, enquanto a esmagadora maioria vive submetida a mais absoluta miséria, exploração e opressão. Nestas condições, os problemas vividos pela maioria dos trabalhadores são de tal ordem que só acabando com o poder do capital, ou seja, só com o socialismo é possível resolvê-los efetivamente.
A crise do capital, que se instaurou a partir do final da década de 70, continuou na década de 80 e se agravou no iniciou da de 90, com a intensificação da grande ofensiva neoliberal do imperialismo, criou todas as condições objetivas para a Revolução Socialista no Brasil. E do mesmo modo que os Partidos Comunistas de toda a América Latina, reunidos em Havana em 1975, afirmaram que o capitalismo não resolve nenhum problema da América Latina, Luiz Carlos Prestes, em 1980, no Brasil, em sua histórica “Carta aos Comunistas”afirmava:
Nos últimos anos, sob a égide do regime militar, a grande burguesia monopolista, aprofundou todas as características fundamentais da sociedade brasileira: a dependência ao imperialismo, o domínio dos monopólios nacionais e estrangeiros e do latifúndio, confirmando um quadro de crescimento absoluto (...) da miséria dos trabalhadores, agravando-se as desigualdades sociais e tornando-se ainda mais crítica a situação do campo com as transformações capitalistas ocorridas na agricultura e as modificações introduzidas no sistema latifundiário (...) a proliferação dos minifúndios e dos chamados ‘bóias-frias’.Simultaneamente, cresceu vertiginosamente a criminalidade e a violência nas grandes cidades, agravaram-se problemas antigos como o do menor abandonado, do desemprego, a falta de assistência médica, o analfabetismo e a prostituição de menores, isto comprova, mais uma vez, que o desenvolvimento capitalista não é capaz de resolver os problemas do povo e nem sequer de amenizá-los”.
(Prestes, Luiz Carlos, em “Carta aos Comunistas”, São Paulo, Alfa-ômega, 1980. pp.23-24)
O grande movimento operário de massas, que marcou o fim do regime militar e a mudança na forma da ditadura de classes da burguesia, da ditadura militar para a democracia burguesa, fez manifestar com toda a força a crise econômica no país, a partir da década de 80. Todas as peripécias e manobras da burguesia somente a empurram para um beco sem saída. Por um lado, porque agudiza-se a contradição entre o capital e o trabalho que, no estágio monopolista do sistema, exige sempre a saída imperialista; mas como isto não é possível sem uma guerra de rapina e a burguesia não dispõe de autonomia para tal, a crise fica sem solução dentro do capital. Por isso, todas as políticas econômicas neoliberais ou keynesianas, planos de estabilização e demais remendos na Constituição efetuados pelos governos atuais, a exemplo dos governos militares, descarregam o ônus da crise nas costas dos trabalhadores, das camadas médias assalariadas, da pequena-burguesia e dos setores da burguesia não monopolista. E, com isto, agrava-se ainda mais a crise financeira, como demonstra o quadro falimentar das empresas e de instituições financeiras (bancos Econômico, Comercial e Mercantil). A crise de superprodução e de acumulação aprofunda a divisão da classe dominante e um salve-se quem puder entre as oligarquias no país mostram que os de cima já não podem viver mais como antes.
Por outro lado, agrava-se também a situação de penúria da classe operária, já por si só miserável, e das massas populares, em virtude do desemprego, da fome, do pauperismo, constituindo-se um quadro em que cerca de 43 milhões de seres humanos vivem sob condições subumanas de indigência e numa desesperadora luta pela sobrevivência. Com isto, intensificam-se as ações da massa de famélicos que violam a ordem e a propriedade privada. Trata-se de uma situação de terrível miséria e absoluta opressão, que concentra na classe operária uma grande energia revolucionária, capaz de se transformar em movimentos maciços, como ocorreu durante a campanha pelas “Diretas Já”, o “Movimento pelo impeachmentde Collor”. É o que sinaliza, claramente, o aumento dos saques e arrastões, rebeliões nas penitenciárias, os seqüestros, as invasões de terras, quebra-quebras, greves pontuais etc., mostrando que se intensifica a violação da propriedade privada e da ordem burguesa.
E o que é isto, senão os indícios de uma situação revolucionária? Lênin definiu da seguinte maneira a situação revolucionária:
Quais são, em termos gerais, os sintomas distintivos de uma situação revolucionária? Quando não é possível para as classes governantes manterem sua dominação sem nenhuma mudança; quando há uma crise, de uma ou outra forma, entre as ‘classes altas’, uma crise política da classe dominante, que abre uma brecha pela qual irrompem o descontentamento e a indignação das classes oprimidas. Para que estale a revolução não basta, em geral, que ‘os de baixo não queiram’ viver como antes, mas também é necessário que ‘os de cima não possam’ viver como até então; quando o sofrimento e as necessidades das classes oprimidas se tornarem mais agudos que habitualmente; quando, como conseqüência das causas mencionadas, há uma considerável intensificação das atividades de massas...”.
(V. I. Lênin, “La Bancarrota de la II Internacional”, in Obras Escogidas, Buenos Aires, Editorial Cartago, 1973, t. III, p. 232-233)
Mas Lênin acrescentava, também, que uma situação revolucionária se forma independentemente da vontade dos grupos, partidos ou mesmo classes - citando Engels - e que por isso:
uma revolução não se produz em qualquer situação revolucionária; se produz somente numa situação nas quais as transformações objetivas citadas são acompanhadas por uma transformação subjetiva, como é habilidade de uma classe revolucionária para realizar ações revolucionárias de massas suficientemente fortes para destruir (ou deslocar) o velho governo, que jamais, nem sequer nas épocas de crise, ‘cairá’ se não o‘faz cair’.”
(V. I. Lênin, ibdem)
Mas, no caso brasileiro, para que a classe operária transforme todo o seu potencial revolucionário em ações concretas, de massas, com força o suficiente para derrubar o velho governo das oligarquias burguesas, travestido de neoliberal e moderno, é necessário um elevado nível de consciência de classe e de organização. O que é uma tarefa quase impossível de ser realizada a curto prazo, já que a organização superior da classe operária, o Partido Comunista, foi tragicamente destruída pela reação e o MCB se encontra fragmentado em dezenas de organizações e círculos marxistas, muitos totalmente desligados da classe operária e mergulhados em uma profunda crise ideológica.
A crise, como já afirmamos anteriormente, decorre de dois fatores: da inexistência de uma direção teórica, que é a estratégia revolucionária, e da inexistência de uma direção prática, ou seja, uma organização de quadros comunistas revolucionários reconhecida e respeitada pela classe operária. Isto se manifesta tanto na capitulação teórica, como na degenerescência da prática revolucionária, dos agrupamentos que compõem o MCB, influenciando todo o movimento operário e popular no país. Isto é comprovado pelo seguinte:
a) pelos agrupamentos que mudaram de posição depois da queda do campo socialista e da URSS ou sofreram cisões — PCB, PCdoB, PLP, RPC, MTS, MR-8, CS, CO, PRO, ALP, MTM, MCR;
b) pelos agrupamentos que sofreram de degenerescência teórica e prática — PCB, RPC, MTS, CLCP, CS, PLP, PCdoB, PRO, MCR;
c) agrupamentos que sofreram mais de degenerescência teórica que prática — PCdoB, PLP, CO;
d) agrupamentos que sofreram mais de degenerescência prática que teórica — CLCP, MR-8, CS, MTM, MCR;
e) agrupamentos que se desintegraram totalmente — PCB, RPC, MTS, CLCP;
f) agrupamentos que mudaram de forma — ALP, MR-8, CS, PLP.
Vemos pois, que nenhum agrupamento passa ileso à crise. O caso do PCB e PCdo B são bastante ilustrativos do processo. Após o desligamento de Luiz Carlos Prestes e de centenas de militantes do PCB, o agrupamento que fica com a sigla se divide: sua maior parte se fusiona a setores da classe dominante e dissidentes do PSB, muda o nome do partido para PPS e abandona de vez o marxismo. A parte menor briga pela sigla e, para se manter agrupada, renega o Marxismo-Leninismo e o centralismo democrático. A deficiência teórica e de quadros os leva a uma política suicida, legalista e eleitoreira, para atrair, a qualquer preço, “aderentes” ao partido. Prestes, diante da fragilidade dos quadros que o acompanhara, se recusa a organizar um partido e passa a defender posições revolucionárias isoladas, até o final de sua vida. Os agrupamentos que se formam em oposição à política de Prestes—RPC, MTS, PLP e mesmo o CLCP— são incapazes de se firmarem nacionalmente. Parte destes se diluem totalmente (RPC, MTS e CLCP) no PT, PDT, PSB, PMDB e PSDB. O caso do PCdoB é o mais flagrante de capitulação, cinismo e chauvinismo. Ele, que se reivindicava o cerne do stalinismo no país, em seu último Congresso declarou “que nunca fora stalinista” , que as teses do Partido Único e da Ditadura do Proletariado estão superadas e o seu “Programa Socialista” para o Brasil definiu como “socialista de mercado”.
Os agrupamentos remanescentes da luta armada, que foram atraídos pelo PT e pretendiam transformá-lo em Partido Revolucionário, em menos de 15 anos diluíram-se no seu interior e hoje são prisioneiros, política e ideologicamente, do “socialismo petista”, que no fundo não passa da velha corrente chauvinista social-democrática, reformista e anti-marxista, que adota a velha estratégia de humanização do capitalismo selvagem no país. O MR-8, com sua estratégia direitista herdada do PCB, após o longo período de ulissismo, tornou-se o braço direito do quercismo e, de cisão em cisão, avança para a diluição fisiológica dentro do PMDB. Os agrupamentos que se desiludiram com a construção “da sagrada família na família terrena”, através do PT (CS, PRO, CO, etc.), ou que se fundiram no PSTU (CS, PFS — ex-PLP...), assim como os que lutam pela sigla PCB, círculos remanescentes do “prestismo”,apesar da resistência, não fomos capazes, até o momento, de nos constituirmos nacionalmente, bem como elaborar um projeto de caráter nacional e obter o reconhecimento e a adesão das massas.
Hoje, a imensa maioria dos agrupamentos e círculos marxistas, que floresceram com o esfacelamento do PC, são oriundos da pequena-burguesia. Poucas são as organizações ou círculos que forjaram seus quadros a partir da classe operária. Constituiu-se, desta forma, um quadro de militância onde coexistem cerca de 3 gerações de comunistas a influenciar a formação de uma 4ªgeração de revolucionários, que despertaram durante a luta pelas liberdades democráticas e o fim da ditadura militar e continuam a despertar, no país. A primeira geração é aquela que se formou durante as décadas de 20 e 30, período da constituição inicial do Partido Comunista, que foi profundamente influenciada pela insurreição armada de 1935 e já quase inexistente; a segunda se formou nas décadas de 40 e 50, período em que o movimento assume características contraditórias, ora radical, ora conciliadora e a terceira é a que iniciou sua formação com as grandes lutas de massas, regidas pela tese da coexistência pacífica e da luta armada contra a ditadura. Nas duas primeiras, a classe operária teve forte presença. Na última, dada a posição de recuo do PCB frente à luta armada contra a ditadura, o predomínio passou a ser exclusivamente da pequena-burguesia.
E o inimigo de classe, diante deste quadro, age no sentido de dificultar, “sabotar” a formação do fator subjetivo da revolução. Sua tática é apoiar as posições que, abertamente ou por trás de uma terminologia revolucionária, estão a serviço da contra-revolução. A reação estimula todo aquele que, dentro do movimento, defenda seus valores e conceitos burgueses de “democracia”, “liberdade de escolha”, “socialismo de mercado” (...) e distorça os princípios fundamentais do Marxismo-Leninismo. Seu objetivo principal é confundir e atrasar a passagem do Proletariado de classe em si para classe para si. Ao mesmo tempo que procura liquidar ideologicamente o MCB, tenta manter sob controle policial-militar as explosões sociais e esvaziar o potencial revolucionário das massas, estimulando campanhas assistencialistas (Natal “Sem Fome”, fim da violência, pelo emprego, etc.) e a formação de organizações políticas reformistas, como o PDT, PT, PSB e PPS, do tipo social-democrata. Esforça-se também para atrair, para essas mesmas posições, as lideranças sindicais combativas ou até mesmo organizações comunistas que, com avaliações incorretas do processo revolucionário brasileiro e da luta de classes, se introduzem por uma via anti-marxista no interior destes partidos reformistas.
Deste modo, para que as condições subjetivas da revolução se desenvolvam, é necessário elevar o grau de consciência e organização do proletariado, como diz Marx e Engels, no Manifesto do Partido Comunista de 1848, “a organização do proletariado em classe e, portanto, em Partido político”, coisa que somente é possível pela ação revolucionária da sua vanguarda consciente: o Partido Comunista, Marxista-Leninista. Mas, “o que fazer” se o Partido Comunista foi esfacelado, o MCB está em profunda degenerescência e dividido, e o inimigo de classe, aparentemente, com pleno controle e agindo contra as tentativas de reorganização do Partido? Ao nosso ver, a resposta para esta pergunta encontra-se na ação revolucionária e nos esforços, ainda que isolados e bastante fragilizados dos inúmeros círculos ou agrupamentos que atualmente se formam e tentam fazer valer a máxima de Marx e Engels, no “Manifesto Comunista” de 1848:
A organização do proletariado em classe e, portanto, em partido político, é incessantemente destruída pela concorrência que fazem entre si os próprios operários. Mas renasce sempre e cada vez mais forte, mais poderosa”.
(Marx e Engels, “Manifesto do Partido Comunista”, Editora Alfa-Ômega)
Mas as propostas desses novos agrupamentos são ainda primárias e impregnadas pela herança de equívocos do MCB, sem um plano tático e organizativo definido e criativo, pregam palavras ocas e levam o trabalho sem conseqüência prática. Nestas condições, o primeiro passo a seguir é, a partir do estudo sistemático da teoria revolucionária, o Marxismo-Leninismo, aplicá-lo à realidade brasileira e estabelecer uma estratégia e plano tático de combate e organização e, através do método da luta de classes (a luta teórica, a luta política e a luta econômica), desenvolver uma prática organizativa específica dos comunistas revolucionários. Essa luta não é nem artificial nem superficial, trata-se de uma luta de classes no interior do MCB em defesa do Marxismo-Leninismo e que, na verdade, terá a função de desmascarar, isolar e extirpar toda a corja de traidores, policiais, vacilões, corruptos, canalhas e falsos líderes, plantados pelo aparelho repressor do inimigo de classe para monitorar, controlar e desviar o Movimento Comunista Brasileiro de seu objetivo revolucionário.
O MCB não se limita somente a esta rede de meliantes no seu interior, nele estão também todos os quadros que, mesmo diante desta situação adversa, continuam a sonhar com a vitória do socialismo e a libertação de seu povo e lutam por isto. São quadros revolucionários que resultam de três gerações de lutadores, que condensam nossa história de lutas e continuam a erguer o punho ao alto em defesa dos valores mais dignos desenvolvidos pela humanidade: o comunismo. Deste modo, a refundação do Partido Comunista tem o dever de, por um lado, resgatar a história do Movimento Comunista no Brasil, seus militantes revolucionários e personagens heróicos, a exemplo de Luiz Carlos Prestes e, por outro, renunciar a toda herança15reformista, conciliadora e nacionalista de direita, também presente no movimento comunista até os dias atuais. Pois, embora a história do ex-PCB seja marcada pelo mais profundo heroísmo e sacrifícios dos seus quadros, sua estratégia equivocada e debilidade teórica e ideológica também desenvolveu uma herança direitista, de desprezo pela mobilização das massas, mandonismo e supressão da democracia interna, que levou ao afastamento de muitos quadros honestos e heróicos e a inúmeras cisões, que facilitaram o seu esfacelamento pelas forças da reação.
O Partido Comunista é uma organização revolucionária, composta por quadros intimamente ligados às massas e reconhecidos pelo seu trabalho junto às mesmas. A sua lógica de construção e implantação obedece sua estratégia revolucionária, previamente estabelecida, que nunca deve ser confundida com uma organização de massas ou uma organização terrorrista. Sua condição de Partido Revolucionário e de Vanguarda não é algo que decorra de uma autoproclamação, é, como diz Lenine16,“nenhuma organização poderá se considerar Partido Revolucionário se as massas não a reconhecerem como tal”. Logo a organização que pretenda a refundação do Partido Comunista deverá ostentar todos os princípios de organização leninistas, diferenciando-se da sua organização no passado (PCB), que mais parecia com um movimento de massas do que com um partido de quadros, propriamente dito.
E quais são os princípios de organização leninistas? Como aplicá-las à situação concreta que vive o Movimento Comunista Brasileiro?
Em primeiro lugar, considerar que o Partido Comunista é o “Estado Maior da Luta de Classes”. É uma organização de revolucionários profissionais, que se constrói “de cima para baixo”, a partir dos filhos e filhas mais talentosos e resolutos da classe operária, e somente comporá as suas fileiras os que, tanto teórica quanto praticamente, demonstrem estarem à altura de integrar-se aos seus quadros. A sua linha de construção não obedece aos impulsos emocionais ou ao desconcerto exasperado, que caracterizam as junções orgânicas dos agrupamentos da pequena-burguesia, e, muito menos, a demagogia das organizações “obreiristas”, que acreditam que um destacamento de vanguarda se constrói “de baixo para cima”.17
Em segundo lugar, que sua linha de construção é um processo dialético, entre o movimento de organização de "cima para baixo", da vanguarda da classe operária, e o movimento de "baixo para cima", da luta de classes na esfera econômica que nos vários confrontos e lutas revela os verdadeiros chefes da classe operária, por sua especial habilidade no comando destas lutas; não são ainda revolucionários conscientes, mas lideranças empíricas, que somente com o estudo rigoroso do Marxismo-Leninismo e sua organização revolucionária adquirirão a convicção científica do Comunismo, tornando-se verdadeiros revolucionários e quadros comunistas.
Em terceiro lugar, considerar que refundar o Partido Comunista não implica na fundação de mais um movimento, cuja lógica seja atender aos anseios de ascensão, na escalada de direção nesta organização política, ou ainda ao oportunismo de constituir uma legenda para utilização e finalidades puramente eleitoreiras da nova aristocracia operária e da pequena-burguesia radicalizada. Isto significa fazer um novo tipo de organização que, guiando-se pelos princípios Leninistas de organização estabelecidos na “Carta a um Camarada”18, reafirme a teoria revolucionária —o Marxismo-Leninismo— seus símbolos, fundadores e enriquecedores, Marx, Engels e Lênin, incorpore a tradição revolucionária brasileira e seja capaz de dirigir o processo revolucionário no país contra o impe-rialismo e o capitalismo e pelo socialismo, vitoriosamente.
Avaliamos que já é possível aplicar à organização do Partido os princípios leninistas de organização e esforçar-se para que eles se efetuem plenamente. Isto possibilitará atingir três objetivos básicos: a) uma preparação séria e uma educação revolucionária de fato dos operários e intelectuais, que integram o Partido, elevando o seu nível de organização, consciência e compromisso revolucionário; b) utilização adequada do princípio eletivo para evitar o oportunismo e a infiltração policial na estrutura interna e c) aproximação dos operários da verdadeira atividade revolucionária, estabelecendo nitidamente as fronteiras entre o Partido e a classe.
Para isto, é necessário levar a cabo um plano geral organizativo, que defina claramente as organizações e níveis de militância que compõem o Partido, ou seja, níveis de militância, pelo grau de organização, em geral, e pelo grau de clandestinidade, em particular.
Assim, temos: 1) a organização dos revolucionários, a mais restrita, clandestina e profissional possível; e 2) a organização dos operários, o mais ampla e diversa possível. Obviamente aqueles que tomem parte em uma dessas organizações e se submeta às suas decisões, será reconhecido como militante do Partido. Estes dois níveis de militantes constituem o Partido Comunista, claro está que uma comporá o centro do partido e a outra, o setor intermediário entre o partido e a classe. Do resultado do trabalho do Partido, em especial, da organização de operários junto à classe, constituem-se: 3) as organizações operárias ligadas ao partido, mas que não são filiadas ao mesmo; 4) as organizações operárias não ligadas ao Partido, porém subordinadas de fato ao seu controle e direção e, por último; 5) elementos não organizados da classe operária, que em grande parte também se subordinam, pelo menos nos casos de grandes manifestações da luta de classes à direção do Partido. E nestes três últimos setores, defendemos a constituição de outro movimento de caráter revolucionário tático, que sirva de cobertura para nossa ação conspirativa, considerando, por um lado, a situação concreta do nosso movimento e suas potencialidades e, por outro, a situação brasileira atual, a nossa estratégia e tática geral aqui definidas.

Notas

(1) CARONE, E. ob. cit. p. 30. BANDEIRA, M; MELO, C. e ANDRADE, A. T. ob. cit. p. 407.
(2) MORAES, Dênis e VIANA, Francisco. ob. cit. PRESTES, Luiz Carlos. Carta aos Comunistas. São Paulo, Alfa-Ômega, 1980. pp.23-24.
(3) ENGELS, F. Anti-Dürhing. Lisboa, Ed. Afrodite, 1977. p. 152.
“Nos limites desta ordem de coisas não saímos, por certo, do pensamento habitual, metafísico; mas quando consideramos as coisas no movimento, na mudança, na sua vida, na ação recíproca de umas sobre as outras, o caso é muito diferente e, então, caímos nas contradições: já a simples mudança mecânica de lugar não pode realizar-se senão porque um corpo, num só e mesmo momento, está num lugar e, ao mesmo tempo, noutro lugar; num só e mesmo lugar e não neste lugar. E a posição constante e a solução simultânea desta contradição é justamente o movimento”.
(4) MARX, K. O Dezoito Brumário de Luiz Bonaparte. ob. cit. p. 203.
“Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, ligadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestados os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar à nova cena da história do mundo nesse disfarce tradicional e nessa linguagem emprestada.”
(5) PRADO JUNIOR, Caio. A Revolução Brasileira. 7ª Ed. S.Paulo, Editora Brasiliense, 1977, pp. 39 - 47 , 86 e 87.

(6) MARX, K. e Engels F. La ideologia Alemana. Buenos Aires, Ediciones Pueblos Unidos, 1973. pp. 11 e 12.
(7) SILVA, Francisco, C.T. A Modernização Autoritária: Do Golpe Militar à Redemocratização 1964/1984. In: História Geral do Brasil. Rio de Janeiro, Editora Campus, 1990, p. 275.
(8) PCdoB. Programa Socialista para Revolução Brasileira. 1995. OLIVEIRA, Isabel R. Trabalhadores e Política - As Origens do Partido dos Trabalhadores. Petrópolis, Vozes, 1988. pp. 135.

(9) PRESTES, Luiz Carlos. Entrevista ao Jornal da Unicamp. Ano I, nº 9. Campinas, maio de 1987. p. 3. Ver também, Tribuna de Minas, de 7 de Julho de 1987 : “Eu tive um dado recente, que, do total da classe operária brasileira, só são organizados em sindicatos, 10%.”. RODRIGUES, Leôncio M. Partidos e Sindicatos. ob. cit. p. 139.
(10) RUZ , Fidel Castro. “Discurso de Abertura do Forum de S.Paulo”. Jornal Granma Internacional, Havana, ano 28. Edição brasileira— Editora Inverta, nº 32, de 30 de agosto de 1993.
(11) PRESTES, Luis Carlos. Entrevista ao Jornal Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, de 29 de dezembro de 1988.
(12) MARX, K. Marx e Engels Cartas - Marx a L. Kugelmann, de 12 de abril de 1871. In: Obras Escolhidas, Volume III, S.Paulo, Editora Alfa-Ômega, pp. 262 e 263.
(*) Durante o golpe militar de 1964, os Estados Unidos deram cobertura aos golpistas, através da operação militar conhecida como Brother San: uma frota de marines norte-americanos que aportou no Espírito Santo. Ver SILVA, Carlos Teixeira F. ob. cit. p. 292; e MONIZ, Bandeira. Presença dos Estados Unidos no Brasil. cap. XLVIII. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978.
(13) MARX, K. O Manifesto do Partido Comunista. ob. cit.

(14) MARX, K. O Capital. Ob. cit.
(15) PRESTES, A.Leocádia. A Herança Que Os Comunistas Devem Renunciar. Oitenta, Porto Alegre,4:199 e 223, 1980.
(16) LENINE, V.I. Que Fazer. ob. cit. pp. 138 e 139.
“Porque não basta intitular-se ‘vanguarda’, destacamento avançado: é preciso proceder de modo a que todos os outros destacamentos vejam e sejam obrigados a reconhecer que marchamos à cabeça.”

(17) LENINE, V.I. Desconcerto Exasperado. In: Obras Completas, tomo 12. Buenos Aires, Ed. Cartago. Artigo de abril de 1907, citado por Luiz Carlos Prestes, em carta de 23/07/1987: “... a idéia de convocar o Congresso, (cita o documento menchevique) “trará um princípio de coesão à construção organizativa das massas operárias e fará que se ressalte ante elas os interesses comuns da classe operária e seus objetivos...”(e continua Lenine):Primeiro, construção organizativa e depois, os objetivos (grifado por Lenine); quer dizer, o programa e a tática! Não deveríamos raciocinar ao inverso, Camaradas “literatos e práticos”? Refleti: é possivel unificar a construção organizativa se não se unificou a interpretação dos interesses e os objetivos de Classe? Refleti e vereis que não é possível.”
(18) LENINE, V.I. Carta a um camarada.

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